sexta-feira, 27 de junho de 2008

O Seqüestro

3 semanas depois e depois de já ter contado milhões de vezes a respeito, vou escrever o relato definitivo a respeito do meu sequestro.

Era sexta-feira, dia 06/06/08, 21h30, no conjunto Eldorado.
Eu havia saído pra deixar minha mãe em um culto evangélico. De volta, dobrando a
esquina de casa notei 3 moléques meio suspeitos sentados na esquina, mas imediatamente pensei "esses aí devem estar esperando um besta pra puxar uma bolsa, roubar uma celular... vou parar bem lá na frente pra evitar passar perto deles" e
assim o fiz.
Estacionei depois da entrada do meu prédio, peguei minhas coisas e saí do carro. Quando apertava o botão do alarme um dos caras se aproximou com a arma na mão e disse "fica quieta que isso é um assalto!".
Eu prontamente estiquei os braços com a bolsa em uma mão e a chave do carro na outra e disse "leva". Então aproximaram-se mais dois e me mandaram entrar no carro.
Eu disse "não vou entrar! leva o que tu quiser, mas eu nao vou entrar nesse carro" e eles retrucaram dizendo "não reage! não faz escandalo! entra nesse carro senão vamos te matar aqui mesmo".
Dei de ombros e entrei no banco de trás.
Saíram. No caminho, ainda com a arma apontada pra mim pediram que eu entregasse o dinheiro, eu disse que não tinha, perguntaram onde tava meu cartão de crédito que eles iam no caixa eletronico sacar dinheiro, eu não disse nada. Ele, o motorista, começou a falar alto, perguntar onde é que eu tava que não tinha nada, eu expliquei que só havia saído pra dar carona pra minha mãe. E eles começaram um interrogatório: "Com quem eu morava? quem tava em casa que eles iam lá roubar? o que eu fazia? o que minha mãe fazia? o que meu noivo fazia? etc etc etc" perguntas sempre seguidas de respostas engraçadinhas como "ahhhh ela tem dinheiro! com esse carrão como é que tu num tem dinheiro?" (Argh... ódio)
Chegaram em um lugar escuro e me mandaram entrar na mala. Pedi mais uma vez que eles levassem o carro mas me deixassem, em vão.

Entrei, eles fecharam e enquanto entravam no carro eu comecei a procurar uma forma de abrir a mala por dentro. Descobri, mas fiquei quieta, pois estava no meio do nada pra tentar fugir e ainda tomar um tiro.
Eles saíram, som extremamente alto, rodaram rodaram rodaram, pararam diversas vezes, abria porta, fechava porta, "será que eles vão me matar agora?", "tomara que essa mala não abra", o calor, o abafado.... colocaram um cd de rap no radío e deixaram o volume no maximo. "preto favelado só se fode equando os playboy se safa... playboy tem que se fuder bláblá". Uma hora e meia disso enquanto se esta dentro de uma mala não é nada legal.

Em uma dessas paradas eis que eles assaltaram/sequestraram um carro/casal, colocaram o rapaz na mala do carro dele, o gol vermelho e a mulher dele no banco de trás junto com os assaltantes (só fiquei sabendo disso depois).
Mais a frente tentaram assaltaram uma moça que estava em sua moto, vizinha do rapaz que tava na mala e ela reagiu. Fez um escandalo e chamou a policia. Eles, agora 5 indivíduos em 2 carros e 3 reféns, fugiram. Eis que o som baixa e eu escuto lá de dentro "não vai poraí não que tem uma viatura ali no final da rua pô!!". Uma curva feita cantando pneu, sirene, tiros... Alta velocidade, eu me segurando, fuga...
Começo a pensar "Deus, se você existe mesmo me tire dessa situação AGORA! Não adianta acreditar em um Deus se eu não ganho nada com isso! Eu que sou uma pessoas boa e mesmo assim estou passando por isso"
Pouco tempo depois a velocidade diminui, a sirene e os tiros somem. Curvas e mais curvas. Uns 15 minutos se passam e o carro pára. O carro é desligado, as luzes apagadas, varias portas são abertas e então fechadas. Mais uma vez o pensamento "será que é agora que eles vão me matar?" Ouvi uns cachorros latindo lá fora e fiquei quieta. Uns minutos se passam, tudo ficou quieto e eu pensei "vou sair". E então escuto alguem tossir do lado de fora. O pensamento "ahhh não!! meu Deus, faz com que isso tenha acabado!! faz com que eles tenham ido embora!! eu não aguento mais! já dei o melhor de mim esse tempo todo! fiquei calma, não reagi! mas por favor, não aguento mais!"
Mais uns 5 minutos de espera agoniante 'esticando' o ouvido pra tentar captar qualquer coisa de diferente lá fora e nada. Só silencio. Então falei pra Deus "me dê um sinal de que posso sair daqui, que não seja som humano pois vou pensar que são eles." E algo aconteceu... ouvi o barulho de um carro passando e pensei "é o meu sinal! agora eu entrego nas tuas mãos, Deus."

Abri o trinco da mala, fui saindo devagar, olhando em volta... ninguém. Vi um casal passando na esquina, corri na direção deles descalça, descabelada, toda vermelha do calor e pedi ajuda. Expliquei nervosamente o que tinha ocorrido e comecei a chorar. Enquanto o rapaz ligava pra um amigo policial, 2 motos da policia dobraram a esquina. Explicamos o que havia acontecido e eles retrucaram dizendo que estavam mesmo procurando meu carro.
Nesse momento fiquei sabendo que o gol vermelho havia colidido num corolla durante a perseguição e os bandidos daquele carro estavam presos.

Fomos pra delegacia. Pouco tempo depois a moça da moto que reagiu chegou lá perguntando pelo rapaz do carro vermelho e então ouvi o policia proximo a mim dizer "ela ainda não sabe?". Foi quando fiquei sabendo que o rapaz do outro carro havia morrido com um tiro na nuca. =/
Não sei em que ocasião ele foi baleádo, só sei que morreu... e podia ter sido eu. Por um segundo você se sente meio culpado de ter sobrevivido. Mas acredito que tudo que Deus faz é bem feito. E que se aconteceu com ele e não comigo era pra ser assim.

Bom... Só pude vir pra casa as 3h30 da manhã, sem a minima vontade e com aquela sensação escrota ao pensar que teria de dobrar aquela esquina de novo...

No domingo de manhã saiu uma matéria no jornal Em Tempo falando do ocorrido. E falando detalhadamente sobre mim. Meu nome completo, a placa e o modelo do meu carro, meu endereço... sendo que meus sequestradores não froam presos. Apenas os do outro carro. Fiz um post de revolta na meu fotolog a respeito: link

É chato olhar pro lado e achar que pode ser o cara que te sequestrou. É chato saber que eles eram moleques, galerosos, comuns, do tipo que tem milhares aqui em Manaus.
Anyway... não vou me deixar aterrorizar! Não sabia queestavamos em guerra, por isso me pegaram a 1a vez. Mas agora eu sei. ;)

Muitos não acreditam, mas eu não tive tanto medo de morrer. Eu REALMENTE só não queria morrer DESSA forma. Como um bicho, na mala de um carro. =( Também não queria que o outro rapaz tivesse passado por isso. É triste... mas SEI que ele tá com Deus agora. Num lugar melhor. Ou numa situação melhor. Está em paz!
Voltando ao assunto, claro que também pensei em todos os meus projetos inacabados e os nem começados. No meu noivo aqui em casa me esperando sem saber o que me acontecera 3 andares abaixo dele. Na minha mãe lá rezando sem saber o que tava acontecendo. Nos meus gatos. Na minha vida, sem mim.
É bom pra gente ver que a vida pode acabar muito rápido. E que se queremos fazer algo, que seja agora, pois a oportunidade pode ser arrancada de nós de repente.
Eu confontei Deus. E ele me provou que estava ali, só esperando eu acreditar de verdade e pedir sua ajuda. E quando eu pedi, ele atendeu. De verdade. De forma irrefutável pra mim. =~)
É bom passar por esse tipo de experiência e sobreviver. Muita coisa gira na nossa cabeça, muita coisa muda. De fato, de fato não tantas quanto eu desejaria. Mas o sentimento muda! E o pensamento também. As coisas comigo podem até continuar andando a passos lentos, mas estão andando. Estão mais reais.

É isso. I'm alive, my friend!

quarta-feira, 18 de junho de 2008